sábado, 22 de janeiro de 2011

Existência pró-vocada

Há espaços-tempos na vida que não se colocam palavras. Os verbos silenciam-se. Grandes vazios. Tão profundos são que não permitem reverberações. Entrelinhas da vida que existem como um não-ser. Sem saber-ser são não se sabendo. O viver encontra formas e arranjos para lidar com o não-controle, com o não-saber gerir-se. Nem formas e arranjos chegam ao universo produzido pelo vazio existencial. Não se alcança o vazio produzido em escalas de grande proporção. De outro modo e por outro ângulo, essa existência vazia e sem palavras apresenta-se e mostra-se nas faltas, nas ausências inexplicáveis. Ela arranca no estar-sendo, a dor. Eleva o espírito e a alma até aonde não imaginava chegar. Mergulha-se num existir doido, no entanto, vital. Silenciado pela ausência que não encontra eco, o existir arrasta-se. Pela falta das palavras, pela ausência dos verbos, pela invisibilidade da presença a vida é marcada. O enfrentamento de si mesmo é o risco que se corre, é o desafio que se trava. O outro mostra a imperfeição do estar-sendo. Lançam-se os eus para os espaços escuros e infindáveis do viver. Trava-se a guerra necessária. A ilusão insiste ser o não-existir. A morte dela também. No combate entre ilusão e existir-não-sendo, a morte é vital. Emoção demente produzida sem uma sapiência que a explique. Inexistência racional e profusão do delírio. Desejo desenfreado capaz de produzir demasias, conflitos, negações. Na incapacidade-capaz de dar conta de si e do outro que produziu um si no eu, a vida explode. Não se podem juntar peças, nem fazer mozaicos. Caleidoscópios emergem nas tramas temporais e nos delírios nodais dos espaços embrionários. O que já foi não é. O que é já foi. O que está sendo pode tornar-se. Vazios carregados de intensos metamorfismos. Violentas intempéries criadoras. Tornar-se exige graus elevados de demência e eloqüência; têmpera e desvios. O que em tempo não foi, pode ser. Os vazios são criativos. Existir exige pró-evocação. Eus evocados, pró-vocados – ethos lúdicos.

NOGUEIRA, Valdir.

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